
Um pequeno conto de amor e adoção
Era uma vez e ainda é, num lugar aqui, ali e acolá, uma jovem mãe esperava para dar à luz e trazer ao mundo seu filho. Porém, por estes motivos que a vida nos presenteia, ora nos fazendo crer que é ruim e ora que é bom, esta jovem mãe, apesar de amar muito o filho que esperava, não tinha muitas esperanças de poder criá-lo, uma vez que esta gestação havia sido fruto de uma intensa e passageira paixão. Não tenho como precisar, mas talvez ela nem tenha contado ao pai da criança a respeito dela.
Assim, apesar de cuidar com muito amor do seu bebê durante nove meses, ela providenciou pra que ele fosse dado pra adoção, abrindo em seu coração um lugar para o desapego necessário pra realizar a grandeza deste gesto: dar seu pequeno menino para uma família a qual, ela rezava, pudesse amá-lo e cuidá-lo com o amor e carinho que ela lhe daria.
Contudo, até o último instante, ela tinha dúvidas se conseguiria.
Chegou então o dia do nascimento. O parto foi tranquilo, apesar de doloroso. E ela, apesar de querer envolvê-lo em seus braços e dar-lhe o leite, sabia que, se ela o fizesse, não teria mais coragem de separar-se dele. Então, depois de fitá-lo profundamente, disse: “Sinto muito, meu filho! Eu não posso!” Assim, viu a enfermeira afastar-se com o menino enquanto sua visão embaçava-se com suas lágrimas. Ela sentia, no seu coração, que isso precisava ser feito. Da mesma maneira que sabia que estaria sempre com ele no seu coração.
Bem, como oração de mãe tem muita força, ele realmente foi acolhido por um casal que muito o amou desde o primeiro instante. A mãe adotiva deste menino sentia em seu coração o amor que brotava do coração daquela jovem mãe. Por isso, sempre que podia, falava para o menino a respeito dela, procurando ensinar-lhe que ele deveria ter amor e gratidão por ela.
Assim o tempo foi passando, o menino crescendo e, vez ou outra, este assunto vinha à tona e, aos poucos, ele foi encontrando o caminho pra um dia chegar a sentir-se plenamente amado e acolhido pela vida. Não eram poucas as vezes em que o garoto se sentia inseguro e temeroso, como se lhe faltasse algo. Por mais amor e carinho que lhe dessem seus pais adotivos, algo lhe faltava.
Seu pai adotivo, que tinha por profissão viajar, costumava criar passarinhos. Um dia, nosso menino estava fazendo seus temas enquanto sua mãe adotiva limpava a gaiola do canarinho da terra do pai. Como eu dissera antes, várias tinham sido as conversas a respeito de sua mãe, todavia eles nunca haviam falado à cerca do pai. Então, naquele dia, no exato momento em que ela abria a portinha da gaiola para limpá-la, ele perguntou: “Mãe! E o meu pai? Ele me abandonou?”
Quando estas palavras foram pronunciadas, o canarinho saiu voando de dentro da gaiola e começou a sobrevoar a sala, batendo nos vidros das janelas. Teriam que agir rápido, pois ele poderia se ferir ou até morrer. Então a mãe disse: “Pega ele, filho!”
Num salto e com uma coragem inesperada, ele pegou um pano e conseguiu cobrir o passarinho e, com carinho e bem devagar, foi descobrindo-o, acabando por ficar com ele entre suas duas mãos e bem junto do peito. Podia sentir o coraçãozinho do pequeno pássaro batendo acelerado junto com o seu.
Mãe e filho se olharam e parecia que ambos sabiam que não havia mais necessidade de resposta pra sua pergunta. Ele, então, colocou o passarinho novamente na gaiola e fechou a portinha. Assim, ficaram se olhando por um longo tempo, mãe e filho do lado de fora e o passarinho do lado de dentro, com seu biquinho colada entre as grades.
O menino foi o primeiro a quebrar o silêncio: “Mãe, vamos soltá-lo?!”
A mãe, embora tivesse sentindo este mesmo ímpeto, sentia que não poderia fazê-lo, pois o passarinho era do pai. Era uma questão de consideração e respeito.
“Mas, mãe! Liga pra ele e explica!”
Ela, então, ligou pro marido e explicou da melhor maneira que conseguiu, tentado traduzir em palavras, todo aquele sentimento. Não se sabe com detalhes o que o pai entendeu, mas pela sua resposta, acredita-se que o essencial, ele captou: “Tá, solta, então. Mas eu acho que ele não vai sobreviver.”
Antes de dar continuidade à história, voltemos no tempo uma semana. Todos os dias, a mãe costumava colocar o canarinho no avarandado da casa para pegar ar e sol. Aconteceu que, um dia, apareceu um outro canarinho da terra e pousou do lado de fora da gaiola, agarradinho nas grades. Ele comia um pouco do alpiste que estava ao seu alcance, trocava alguns trinados com o passarinho da gaiola e depois ia embora. Este ritual vinha se repetindo por uma semana.
Voltando agora para o momento onde paramos. A mãe e o filho vão até o pátio, colocam a gaiola sobre o muro, abrem sua portinha e afastam-se para apreciar o espetáculo da libertação do canarinho. Entretanto, pra sua surpresa, ele ficou parado na portinha olhando para fora e não saiu. Passados alguns instantes, quem apareceu? O outro canarinho. Então, como a portinha estivesse aberta, ele entrou, comeu o alpiste do pratinho, trocaram alguns trinados, desta vez mais longos do que os outros, e partiu. Deixando seu amigo na portinha a contemplá-lo.
No dia seguinte, o passarinho ainda estava na gaiola quando seu amigo voltou. Após a repetição do já costumeiro ritual, o passarinho visitante saiu, deu uma pequena volta e retornou à gaiola. Então saiu novamente, mas desta vez acompanhado de seu amigo. Voaram felizes por algum tempo e depois novamente retornaram à gaiola, onde, mais uma vez o passarinho ficou enquanto o outro partia. Já no final da tarde, ele regressou à gaiola e novamente os dois saíram para um longo e livre voar.
No dia seguinte, pela manhã, os dois foram vistos pela mãe e o menino num galho de árvore próxima. Aquela foi a última vez que foram avistados por eles.
Alguns de vocês podem se perguntar: “Mas e o que aconteceu com eles?” Esta resposta pode ser encontrada no mesmo lugar onde está o futuro do menino. O que aconteceu com ele? Com as inseguranças que sentia? Conseguiu superá-las. Encontrou uma pacificação com a sua história?
E o passarinho? Sobreviveu?
Caso queiram muito saber, que tal perguntar ao menino?